Amadurecimento de um leitor

Bernardo Colonna Souza (Curso Técnico em Eletrotécnica Integrado ao Ensino Médio)
Revisão textual: Rivana Zache Bylaardt (Professora de Língua Portuguesa, de Literaturas de Língua Portuguesa e de Língua Espanhola)

A leitura é sempre considerada a forma mais simples e acessível de se conhecer outros mundos em prazerosas viagens, sendo o abrir da capa de um livro o seu bilhete de passagem, e o roçar de seu olhar nessas páginas, o voo que para longe vai te levar. Ser leitor, então, é acostumar-se a visualizar aquilo que não se vê ao redor, dialogar com figuras distantes em busca de experiências e conhecimentos enriquecedores, que valham a pena. Em busca do que nos completa.

Minhas viagens começaram cedo. Aos quatro anos de idade, ainda em Nova Venécia-ES, minha cidade natal, fui apresentado a uma obra infantil que tratava, em suma,  do respeito aos animais e biomas. Passando muito tempo esparramado sobre ela pelo chão da casa, conheci a importância da preservação ecológica em nosso planeta e maravilhei-me com a beleza de botos-rosa, jacarés e tartarugas. Eu já sabia ler, não textos verbais, mas todos os significados que aquelas imagens traziam consigo, muitas vezes se projetando para fora do livro como uma maquete, o que chamaria a atenção de qualquer criança curiosa. Da decifração daquelas letrinhas misturadas nas páginas, se encarregava minha mãe, que sempre me incentivou quanto à leitura. Por tudo isso, hoje eu sei: lugar de peixe é no rio, jacaré não pode virar bolsa e, mesmo que eu passe frio, onça não deve virar cobertor. A partir daí, minha caminhada literária se faz contínua, sempre me aventurando por diferentes gêneros e pelas mentes de diferentes autores.

Assim como um ávido turista, o leitor sabe o valor de uma bela viagem e sente o desejo de revisitar as paisagens que o marcaram. “O pequeno príncipe”, por exemplo, já li até em outro idioma. Meu primeiro contato com ele foi aos quinze anos de idade. Decidi tomar o exemplar que achei no fundo da estante de casa, um pouquinho empoeirado, como um passatempo para aquele dia em que acompanharia minha mãe em uma ida ao hospital, na cidade de São Mateus, onde residimos atualmente, para um atendimento de urgência.

Na sala de espera, de paredes brancas como neve e ar congelante, tive contato com aquele livro rico em aquarelas e textos simples, sintaticamente simples, já que compreender os sentimentos transmitidos pela obra não é uma tarefa fácil. As primeiras linhas pelas quais meus olhos passearam foram capazes de me prender a atenção fortemente.

O narrador inicia seu discurso expondo-me sua percepção sobre a dificuldade que os adultos têm em enxergar mais do que seus olhos podem ver, ou seja, usar sua imaginação. São sempre sérios, até rabugentos, gostam de conversar sobre números e sempre precisam de explicações, por isso não entendem os primeiros desenhos feitos pelo autor, que acaba se frustrando e desistindo da carreira de artista, aos seis anos de idade. Em outros momentos, O pequeno príncipe, viajando por diferentes planetas, indaga a todos que encontra sobre diferentes temas e nunca aceita que suas perguntas sejam levadas pelo vento sem resposta.

Ao longo da narrativa, passava por mim uma reflexão inquietante: enquanto cresço, pareço perder um pouco daquela imaginação e curiosidade que tinha quando criança. Em épocas passadas, nunca me contentava com as verdades que as pessoas maiores me transmitiam como absolutas, queria sempre saber o porquê das coisas: “Por que o céu é azul?”, “Por que enquanto aqui em casa é dia no Japão é noite?”, “Qual é o sentido da vida?” diante de tantas perguntas, os adultos chegavam até a irritar-se.

Retornei para este planeta já bem próximo da meia noite, quando fechei o livro e deixamos aquele hospital. Desde o findar daquele dia, entendo que questionar, fazer uso da curiosidade e da criatividade, assim como fazem as crianças, é importante para entender melhor o mundo que me rodeia. Amadurecer não deve ser entendido como o esquecimento de todo o comportamento que se tem nos primeiros anos de sua vida, mas sim a filtragem e o aprimoramento de todos os modos de pensar e agir que vão contribuir para nossa existência. Acostumamo-nos a pensar que sabemos muito e que conhecemos o funcionamento do universo em que estamos inseridos, da mesma forma que os personagens figurados na obra. Mas basta uma curta pergunta para que a muralha de nosso ego seja quebrada: “Por quê?”.

Comentários

Postagens mais visitadas