Querida Sam

Autora: Luiza Pauli de Castro  (Curso Técnico em Eletrotécnica Integrado ao Ensino Médio)
Texto inspirado na obra "As vantagens de ser invisível", Stephen Chbosky, classificado em 3º lugar no Concurso Literário 2022 do Ifes Campus São Mateus.

Querida Sam,

Espero não te assustar ao enviar esta carta. O Charlie falou muito de você ao longo das diversas cartas que escreveu. Você tem conhecimento delas? De qualquer forma, sei que, para você, posso ser uma desconhecida, pois não chegamos a nos encontrar, mas, após tantas histórias contadas pelo Charlie, desenvolvi certo carinho e admiração.

Pela data, acredito que já tenha se instalado na universidade. Soube que, no dia 21 do mês de junho foi a despedida oficial. Espero que tenha aproveitado a noite ao lado de Mary Elizabeth, Patrick, Alice, Bob e Charlie, pois passará algum tempo sem vê-los. Em seu lugar, eu estaria bem preocupada, visto que sempre tive dificuldades em fazer novos amigos, porém você nunca foi assim, né?! Então não me preocupo tanto. Lembro de quando conheceu o Charlie naquele jogo de futebol americano em 6 de outubro de 91… Chega a ser engraçada a tamanha facilidade que você e o Patrick tiveram em acolher um garoto quase aleatório. O mundo precisa de mais pessoas como vocês, certamente! É inegável o quanto vocês ajudaram esse garoto durante toda a trajetória de amizade que desenvolveram. Falo, principalmente, de você, Sam. Arrisco dizer que essa amizade o salvou.

É provável que você saiba muito mais do que eu, mas o Charlie é um garoto problemático e cheio de traumas. A cada avanço no tempo, conheci mais sobre a história dele. O melhor amigo dele, Michael, faleceu na primavera de 1991. Como dito por ele, no dia 25 de agosto de 1991, em sua primeira carta: “O orientador disse que suspeitava que Michael tinha problemas em casa e achava que ele não tinha com quem conversar. Talvez se sentisse sozinho e por isso se matou”. Você era alguém com quem o Charlie podia conversar e, talvez, por isso, ele ainda esteja aqui. Particularmente, senti-me compreendida, visto que uma das minhas frases preferidas diz que “Pessoas podem viver, desde que tenham ao menos uma pessoa que as ouçam”. Já conheci pessoas que foram essa pessoa para mim em diferentes partes da minha linha do tempo. Sabe o que todas têm em comum? Apesar de algumas terem seguido por outras trilhas, enquanto outras ainda estão presentes, nunca as senti longe. Em meu coração, há um espaço reservado para cada uma delas. Espaços eternamente ocupados.

Além disso, seguindo para outro tópico, você é uma das mulheres mais fortes que já “conheci”. Para quem observa apenas a última versão da Sam, alegre e cheia de si, não é fácil imaginar o seu passado corretamente. Acredito que as cicatrizes internas estejam bem menores, contudo não serei explícita. Torço para você saber a que me refiro, dessa forma não terei que usar palavras ruins. Mesmo que não seja do seu agrado, o Charlie contou sobre a sua antiga reputação. Sei sobre as festas, bebidas exageradas e garotos. Diziam por aí que você era fácil demais, porém sei que a ferida era mais profunda. Não consigo mensurar o tamanho da sua dor. Eu sinto muito que tenham submetido o seu corpo e alma a essas barbaridades e sinto mais ainda por você ter acreditado merecer tudo isso. No entanto, não ache que tenho pena de você, uma vez que não seria o ideal. Em minha humilde opinião, a Sam fez péssimas escolhas, as quais não eram inteiramente dela. Essas também contavam com a participação de outrem, os quais se aproveitaram da situação de vulnerabilidade. Foram pessoas cruéis. Bem como houve contribuição de um trauma mal resolvido. Sinto muito por ter tido o seu primeiro beijo na infância.

Rumo ao final, gostaria de escrever sobre as duas últimas coisas que o Charlie contou. Ele te amou intensamente. Entretanto entendo o que você disse a ele. Inclusive, compartilho do pensamento. “É só que não quero ser a paixonite de ninguém. Se alguém gosta de mim, eu quero que goste de mim de verdade, e não pelo que pensam que eu sou. E não quero que carreguem isso preso por dentro. Quero que mostrem para mim, para que eu possa sentir também”. Sinto que eu já disse isso a alguém. Acho belíssimo o ato de conseguir amar em silêncio, mas não quero um amor assim. Quero que o meu alguém se faça presente e mostre-me amar de todas as maneiras humanamente possíveis. As pessoas precisam dizer o que querem e fazer as coisas de modo que o outro entenda. E só então a pessoa poderá decidir se quer aquilo ou não. Caso não queira, poderá dizer.

Finalizando, sinto que ao escrever sobre você, escrevo sobre nós. Contudo, não se preocupe, pois não tive meu primeiro beijo na infância e nem bebi demais em festas. Caso tenha lido até aqui, agradeço imensamente. Espero que esta carta não tenha soado como um pedido de ajuda, visto que são apenas pensamentos. Escrevi para você, porque como o Charlie disse: “Acho que, de todas as pessoas, você entenderá”.

Como última questão, gostaria de dizer que somos livres, Sam. Devemos ser quem realmente somos e seremos amadas por esse mesmo motivo. Craig nunca te impediu de fazer nada, todavia não te encorajou em nada. Também nunca demonstrou interesse genuíno, o que já era o bastante para que você fizesse menos daquilo. Ele também não disse que as fotos saíam bem por conta da sua beleza. Espero que, nesse novo ciclo da sua vida, você fique com alguém que te encoraje e que diga todas as coisas belas. Não por serem belas, mas por serem verdadeiras. Espero que eu consiga ser assim também.

Com amor,

Lulis

São Mateus, 10, julho de 1992.

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