Devo ser mãe aos 10?

Autora: Isabella Cancela Morais (Curso Técnico em Eletrotécnica Integrado ao Ensino Médio) 1º lugar na etapa escolar e finalista da Olimpíada de Língua Portuguesa 2021 Orientação e revisão textual: Adriana Pin (Professora de Língua Portuguesa e Literaturas em Língua Portuguesa)

Moro em uma cidade chamada São Mateus, localizada no litoral norte espírito-santense que é conhecida pelos seus imensos carnavais, onde há diversas atrações e trios que trazem a cidade inteira para a folia. Além disso, temos a praia da Ilha de Guriri, que atrai fortemente turistas durante o ano, vindo de diferentes lugares só para curtirem um pouquinho o nosso litoral. Entretanto, apesar de todas essas maravilhas, é com pesar que venho falar um fato sombrio que aconteceu recentemente na cidade e impactou não somente os mateenses como também todos os brasileiros. 

No dia 07 de agosto de 2020, uma garota de 10 anos se dirigiu ao Hospital Estadual Roberto Silvares com a sua tia, relatando fortes dores na região do abdômen. De imediato, exames foram realizados e então foi constatado que a criança estava grávida há cerca de três meses. Com a confirmação da gravidez, a menina contou que vinha sofrendo abusos sexuais do próprio tio desde os 6 anos de idade, contudo ela não havia denunciado isso anteriormente por conta das várias ameaças de morte que o homem fazia contra ela e seus familiares. 

Imediatamente, ao ser divulgado, o caso tomou proporção nacional, parando em grandes veículos de comunicação, como o Jornal Nacional, G1, Estadão, e outros, e isso acabou gerando uma divisão entre os brasileiros: uma parcela se dizia a favor do aborto, em que internautas se posicionavam em suas redes sociais, repudiando o ato e que a menor deveria se livrar de uma vez de tudo que lembrasse o abuso sofrido, uma vez que se tratava apenas de uma criança que tinha sido abusada; e a outra parcela — que trazia consigo pregações de cunho religioso de que o aborto é assassinato, logo é pecado — era totalmente contra, mostrando meios de como a menina poderia concluir a gestação e que ela entregasse o fruto da violação a uma casa de adoção. Loucura, né?! 

O Juiz Antônio Moreira Fernandes autorizou a interrupção da gravidez, e a menor foi internada no Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam), em Vitória — capital do Espírito Santo — que se recusou a realizar a operação, alegando não ter capacitação técnica para concluir o procedimento, desse modo ela foi enviada para o Centro Integrado de Saúde Amaury Medeiros, em Recife-PE, todavia a extremista de direita, Sara Giromini, mais conhecida como Sara Winter, divulgou em suas redes sociais a localização da criança que até então era sigilosa. Com o vazamento dessa informação, houve muitos protestos pelo Brasil e principalmente em frente à clínica, onde religiosos se posicionaram contra o procedimento abortivo. Apesar da oposição, a operação ocorreu com sucesso e a menina ficou sob os cuidados do Conselho Tutelar e também recebeu medidas protetivas. O tio da vítima fugiu durante um tempo, porém foi detido em Betim-MG e após ser apreendido, confirmou as sessões de abuso contra sua sobrinha e com isso foi determinado 44 anos, três meses e cinco dias de prisão ao abusador. 

No fim, fiquei de certa forma satisfeita com o desfecho dessa história, pois concordo com o aborto, tendo em mente que, nesse caso, se a gravidez prosseguisse, seria uma criança cuidando de outra criança. Além disso, a menina ia ter que saber da existência ou conviver, caso colocasse para adoção, com o fruto do abuso que ela sofreu durante vários anos de sua vida. Ademais, é reconfortante saber que os youtubers Felipe Neto e Whindersson Nunes anunciaram em suas redes sociais que vão se responsabilizar pelo custeio dos estudos e do tratamento psicológico para a vítima desse ato repugnante. 

É importante lembrar que as crianças precisam de cuidado e proteção, e quando a família falha, é dever do Estado garantir direitos para que estas cresçam de forma saudável. Por fim, é necessário que todos nós, cidadãos e “humanos”, cuidemos de nossas crianças, garantindo a elas o direito à educação, à saúde e ao lazer, além de carinho, dignidade e amor, contando também com a ajuda do Estatuto da Criança e do Adolescente que prevê tudo isso em lei, assegurando que todos — ou pelo menos a grande maioria — tenham uma infância digna.

Imagem: editada por Rossanna Rubim usando Canva.

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