O santuário ecológico teme a chegada do progresso

Autora: Ana Beatriz Almeida Monteiro (Curso Técnico em Eletrotécnica Integrado ao Ensino Médio) 2º lugar na etapa escolar e finalista da Olimpíada de Língua Portuguesa 2021 Orientação e revisão textual: Adriana Pin (Professora de Língua Portuguesa e Literaturas em Língua Portuguesa)

“Tem a glória no passado. Sua história e tanto louvor! Seu progresso nasce. Seu futuro é de projeção.” Assim é cantado no hino de São Mateus, Espírito Santo, o lugar onde vivo. Com uma população de 132.642 habitantes, segundo estimativa do IBGE em 2020, a cidade é uma das mais antigas do país, diversa em patrimônios culturais e naturais, além de ser formada por comunidades tradicionais de pescadores, marisqueiras e quilombolas. 

Formado por dunas, manguezais, fauna típica, restingas, várzeas e tartarugas marinhas, o Balneário de Urussuquara encanta os turistas com sua tranquilidade, considerado um santuário ecológico. Porém, a paz dos moradores e visitantes está sendo quebrada pela discussão sobre a construção do Complexo Portuário de Urussuquara pela Petrocity, empresa fundada em 2013 por um grupo de executivos que conta com a participação de acionistas do Brasil e do exterior. No meio de opiniões favoráveis e contras, uma pergunta se faz: investir no empreendedorismo é apoiar a comunidade local? 

Nessa lógica, há pessoas que consideram o Porto um investimento para os municípios do Norte-Noroeste do Estado. No ano de 2020, em entrevista para o Vitória News, o presidente em exercício da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo (Findes), Leonardo de Castro, afirmou que o porto resolveria um problema estrutural do Espírito Santo, o transporte de cargas. Ademais, de acordo com o senador Marcos Val, a instalação do portuário será imprescindível para o desenvolvimento econômico das cidades. Esse fator tem ligação principal com o planejamento da empresa em gerar 5 mil vagas de emprego, proporcionando maior visibilidade para São Mateus e oportunidade para os cidadãos, além beneficiar grupos privilegiados, pois visa à produção de commodities, que favorece o mercado. 

Por outro lado, as comunidades tradicionais dividem opiniões. Mesmo com a participação em audiências públicas em que a empresa apresentou as propostas de melhorias nos serviços e cuidados com o meio ambiente, as famílias da região não viram tais ações. Além disso, é perceptível irregularidade no projeto ao observar que, em fevereiro e dezembro de 2019, a Petrocity teve requerimento de licença ambiental indeferido duas vezes pelo Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). Vale lembrar que isso preocupa os moradores da região, pois eles já convivem com impactos de outros projetos desenvolvimentistas, como a drenagem da Planície Costeira do Rio Doce, que alterou a dinâmica hídrica do norte do Espírito Santo, reverberando na crise hídrica, salinização das águas e disseminação de rejeitos de indústrias transportados pelo mar. Desse modo, impactou a pesca e cultivos agrícolas, porque uma vez contaminados não podem ser comercializados. Portanto, é através da limitação de acesso à natureza que há o deslumbramento do emprego e do desenvolvimento e, com isso, as pessoas se posicionam injustamente.  

Do meu ponto de vista, a empresa Petrocity deve realizar a construção do portuário de maneira sustentável para um futuro de projeção, sem prejudicar a história dos que lá vivem, como afirmado pelo morador da região, José Luiz Ferreira, em entrevista para o jornal ES da Globo: “espero que essa empresa se compromete com o meio ambiente e bem-estar da população”. Assim, é necessário investir nas comunidades locais e realizar um projeto que vise gerar empregos e manter o encanto e calmaria da praia.  

No entanto, como perceptível no ditado popular da região “Farinha pouca, meu pirão primeiro”, a ganância e egoísmo dos empresários fazem com que o Capitalismo seja valorizado, a desigualdade social aumentada e o meio ambiente prejudicado. Sob esse viés, é necessário lembrar que a economia é importante, mas a preservação da cultura local é primordial. Logo, não deve ser realizada a construção sem sustentabilidade e valor ético, buscando outra alternativa para melhorar a área econômica da cidade. Embora Urussuquara seja um local conhecido no Espírito Santo, ainda há pouco investimento na área do turismo. Dessa maneira, uma opção viável é o governo municipal, juntamente com a Secretaria de Turismo, investir no excursionismo, através da geração de empregos, além de desenvolver e promover atividades culturais, turísticas e de natureza artística. 

Em suma, como já dizia o pensador José Aloísio Portes, preservar a natureza é investir no futuro, ou seja, o progresso pode acontecer sem que prejudique o santuário. A esperança de ter de volta o brilho cristalino nos olhos dos moradores da região, semelhante como eram suas águas, é mantida no dia a dia, sendo fortalecida pela conexão do progresso com a sustentabilidade.

Imagem: editada por Rossanna Rubim, usando Canva.


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