Onde "cataremos" coquinho?

Autora: Isabella de Souza Oliveira (Curso Técnico em Mecânica Integrado ao Ensino Médio)
Orientação e revisão textual: Adriana Pin (Professora de Língua Portuguesa e Literaturas em Língua Portuguesa)

O lugar onde vivo é uma cidade do norte do Espírito Santo, pertinho da Bahia. São Mateus é uma cidade que, com suas marcas, conta a história de um município fundado em 1544 e, povoado através de seu porto, que recebeu durante anos embarcações de africanos escravizados pelo principal rio da cidade: o rio Cricaré. Curiosamente, este rio forma um “S”, de São Mateus em seu percurso.

São Mateus é marcado por suas belezas naturais e seu famoso balneário: Guriri. Este nome, do tupi antigo, significa coco pequeno, em homenagem aos frutos, chamados coquinhos, de uma palmeira típica da restinga. São desses coquinhos que surge a expressão “Vá catar coquinho”, tão popular na região, que em seu sentido conotativo significa o ato de mandar alguém procurar o que fazer, deixando a pessoa em paz.

Porém, não tem sido fácil preservar a nossa cidade. Rios e praias estão cada vez mais poluídos, nossas vegetações são desmatadas e queimadas, nossos animais, que ainda restam, são alvos do tráfico e extintos por não terem onde morar. Dentro disso, é notável o crescimento de loteamentos, que contribuem gradativamente para o desmatamento, trazendo à cidade impactos ambientais irreversíveis.

Com isso, o mercado imobiliário adquire mais lucros, o que não é um problema, entretanto, locais destinados à preservação ambiental são desmatados para dar lugar a loteamentos, e a prefeitura, que deveria fiscalizar tais ações, facilita-as. Áreas de restinga são o maior alvo, pois acomodações, como condomínios e resorts, que são perto da praia atraem mais turistas e traz mais dinheiro.

Segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e a SOS Mata Atlântica, São Mateus é a cidade do Espírito Santo que mais desmatou sua vegetação natural entre 2019 e 2020. Isso mostra que há algo errado com a cidade, uma vez que este  é um impasse silencioso, pouco divulgado, que passa despercebido pela maior parte da população.

Dessa forma, os que possuem mais informação e são contrários aos loteamentos nesses locais, argumentam que a cidade possui outras áreas disponíveis para o mercado imobiliário, porém a ganância é mais importante. Dizem, ainda, que existe apoio e acobertamento da prefeitura em tais ações, atendendo a interesses privados. Os que argumentam a favor, citam a necessidade de investimento no turismo, enriquecendo a cidade, contudo, afirmam que o desmatamento não é ilegal, pois só realizam obras em locais que passaram por um processo de autorização. Além disso, dizem ser algo normal, afinal, moramos em um lugar que também foi desmatado há anos atrás.

Na minha opinião, mesmo não sendo ilegal, essa é uma questão de responsabilidade social com o meio ambiente. Mahatma Gandhi diz que “A natureza pode suprir todas as necessidades do homem, menos a ganância”. O mercado imobiliário pode se expandir, mas deve, em primeiro lugar, respeitar os limites de preservação da natureza, que não podem ser burlados pelo dinheiro.

De acordo com Luis Fernando Guedes Pinto, diretor de Conhecimento da SOS Mata Atlântica, qualquer área desmatada na Mata Atlântica, por menor que possa parecer, é uma perda enorme. Não podemos investir no turismo dessa maneira, pois se continuarmos assim, no futuro, a expressão “Vá catar coquinho” já não fará mais sentido para nós, pois apesar do lado cômico, não haverá lugar para colhermos esse fruto. Reafirmo as palavras de Luis Fernando, pois parece simples, mas é algo muito maior.

Certamente, esse é um impasse de difícil resolução, pois são danos irreversíveis, contudo, creio que possam ser amenizados. Portanto, é necessário que limites sejam estabelecidos pela prefeitura e fiscalizados pelos órgãos responsáveis, sem brecha para corrupção e acobertamento de ações, divulgando notícias nos jornais locais. Além disso, o reflorestamento e a recuperação da Mata Atlântica, na região, faz-se necessário para a população e o planeta, conservando a biodiversidade e mitigando a emissão de gases que contribuem para o aquecimento global.

Somente assim, São Mateus poderá se enriquecer, preservando suas belezas naturais, a verdadeira riqueza que possuímos e somente daremos valor, quando a perdermos. Nossa restinga pede, silenciosamente, por socorro. Precisamos escutá-la.

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