Os três porquinhos do século XXI

Autor: Gustavo Alves Lima (Curso Técnico em Mecânica Integrado ao Ensino Médio)
Texto inspirado na fábula Os três porquinhos

Certo dia, mamãe porca decidiu que era hora de deixar que seus filhos escolhessem o próprio caminho. 

- Meus lindo docinhos - exclama a mamãe porca para seus filhos, que estavam à sua frente, na sala de estar -, acho que a hora chegou. Já é tempo de cada um caçar seu rumo. 

- Ma já?! - interroga o mais novo dos porquinhos. Preguiçoso como era, não tinha a menor vontade de sair de casa. - Não podemos sair por agora. Estamos no inverno. Vamos amanhecer mortos se sairmos por aquela porta. E, além disso, é ano de copa do mundo. Temos que ficar juntos e torcer pelo nosso time. 

- Como assim? Estamos no meio da primavera! 

- Eu também concordo, Mainha - diz, dessa vez, o filho do meio. Embora mais ativo que o caçula, sua preguiça era considerável. - Não temos medo ou covardia para sair de casa. Jamais! Mas acredito que agora não é a hora certa. 

- UAI? - exclama mamãe porca, frustrada - Estão achando o quê?! O mais novo e vocês já tem quase vinte anos. - mamãe porca aponta para o indivíduo esparramado no sofá, com a boca ainda suja do café da manhã - Acham que eu tenho muitos anos de vida para ficar dando tudo mastigado? E você, meu filho, - direciona mamãe porca a pergunta ao terceiro filho - o que acha de tudo isso? 

- Minha mãe, por mais triste que pareça, acho que ainda não é hora de tomarmos nosso rumo por conta própria. Ainda somos imaturos em demasia para tirarmos nossas próprias conclusões acerca do mundo. A maturidade não cresceu em nós três a níveis galopantes. Necessitamos, uns mais outros menos, de um tempo adicional. Mamãe porca faz uma pausa, passando a mão pela testa, limpando o suor. 

- Você está certo. Mais um tempinho seria bom. Mas agora vamos almoçar, senão esfria! 

E os anos se passam. Os porquinhos tentaram enrolar um pouco mais, mas o destino deles já estava traçado. Numa certa manhã, mamãe porca fez três fardos, e deu um a cada filho, com um beijo na testa. E daquele dia em diante, os três partiram para o mundo.

Depois de algum tempo da caminhada, o irmão mais novo começa a ficar fatigado. Percebe que é hora de despedir de seus irmãos da caminhada e ficar por ali. 

- E aí, meu irmão? Já pensou para onde vai? - pergunta ao irmão do meio. 

- Ainda não. Acho que vou pro norte. Dizem que lá é muito tranquilo e muito bonito, na Amazônia. Além de ter um clima agradável e comida de montão! E você? - redireciona a pergunta ao primogênito. 

- Não, eu não vou para o norte. Vou seguindo para o sul. Ouvi dizer que lá as ofertas de emprego estão cada vez maiores. Quem sabe consigo firmar minha vida? Uma casa própria? Quem sabe…

Nisso, os irmãos se separam. Depois da despedida e do “nos vemos um dia” o caçula, que queria ficar por ali, começa a sua jornada solitária. Andando alguns metros, encontra uma clareira cercada por um denso canavial, onde não tarda a depositar camadas de palhas e, com alguns ramos e uns nós, formar sua própria choupana. Não era nenhum hotel cinco estrelas, mas dava para o gasto. Embora estivesse de manhã, ele entrou na choupana para tirar um cochilo. 

O irmão do meio seguiu seu caminho. Até o final do dia, tinha chegado a uma imensa floresta, rodeada por árvores dos mais diversos formatos e cores: a floresta amazônica. Tudo naquilo refletia uma beleza indescritível. Nem mesmo uma fotografia poderia revelar tamanha beleza. No céu, pássaros coloridos voavam e cantavam, como anjos pregados nas nuvens. 

Adentrando na floresta, encontra um espaço forrado com troncos em pequenos cilindros arrumados em fileiras. Como já estava entardecendo, ele começa a juntar alguns, e, em instantes, o seu amontoado de galhos tomou a forma de uma pequena casinha. Com a chegada da noite, entra para conseguir uma boa noite de sono. 

Algumas horas se passam. Um estrondo interrompe o sono do porquinho, que acorda assustado, fez uma pausa, mas o barulho havia sumido. Devia ser apenas fruto de sua imaginação. E então o estrondo surge novamente. Curioso, mas também com medo, o porquinho abre uma brecha na janela. 

Ao fazer a abertura, o animal se depara com um lenhador, com o machado a postos de dar uma terceira machadada no teto de sua casinha. Saindo às pressas, corre para o meio do mato, na tentativa de despistar o lenhador e poupar sua vida. Correndo algumas horas, o porquinho acaba se perdendo num matagal. Correndo para todos os lados em desespero, acaba por sair em uma clareira. No centro desta, um monte de palha se erguia em formato de casa. 

- Não é possível! - Mas era. Olhando pela entrada na cabana, encontra seu irmão, em seu décimo sono, que acaba acordando com a sua presença. 

- Mano? O que faz por aqui? E como me encontrou. 

- Nem sei. Na verdade, eu tinha me perdido nessa mata. Até chegar aqui. 

- Bem, pelo menos não está mais perdido, não é mesmo?! - os dois riem, mas de repente, o mais jovem faz uma pausa. - Espera, está sentindo esse cheiro? 

- Não, que… - o porquinho começou a farejar. De fato, estava ali com um cheiro estranho. - Acho que senti alguma coisa, Parece… fumaça? 

Com um ruído, ambos olham para o tento. Em instantes, labaredas incineram a palha que cobria o pequeno cômodo. Amedrontados, ambos os porcos saem da casinha. 

Do lado de fora, percebem que metade do canavial que os cercava estava em chamas. De dentro da plantação, tatus, pássaros e gatos do mato saiam correndo, alguns com penas ou pelos ainda vermelhos de foto. Sem perder muito tempo, os dois saem correndo dali, sem olhar para trás. 

Amanhece. O caçula acorda mais cedo e chama o irmão. Estavam eles deitados no capim à beira de um córrego. A muitos metros atrás, podia-se ver a fumaça no céu e a faixa de terreno cinza. 

- E agora, o que faremos? - pergunta o mais novo. 

- Não sei. Estou aturdido ainda. Por que alguém faria uma coisa dessas? 

- Sei lá. Mas o que eu sei é que temos mais uma saída: o nosso irmão. Ele disse ia para a cidade. Devíamos ir atrás dele. Ele vai gostar de nos reencontrar. Nisso, os dois irmãos se voltam para o sul. Seguem uma caminhada por quase uma semana, até avistarem a cidade. Uma rodovia mostrava o caminho da entrada no local. Indo em direção contrária, os dois enxergaram, ao longe, um personagem conhecido. Ao se aproximarem, confirmaram: o próprio irmão, a quem estavam à procura. Em instantes, os três já estavam próximos, alegres e sorridentes pela presença um do outro. 

- Meus irmãos! O que fazem por aqui? 

- Estávamos à sua procura. 

- Que engraçado! Eu é que estava indo à procura de vocês! Não irei mentir. Não é somente por saudades. Já estou farto desse local. O salário não é satisfatório. O aluguel é altíssimo. O preço da casa própria? Nem te conto. Parece que tudo que você vê está interligado em pagar dinheiro. Ninguém tem ao menos coragem de andar na rua tranquilamente, por medo de assalto. Paraíso mesmo é o campo, sem essa barulheira todas as noites de carros e motos. 

- E então para onde vamos? 

- Já ouviram falar do complexo do pantanal? É um local em que se pode dizer que tem a particularidade de ter uma biodiversidade imensa em território brasileiro. Tenho certeza de que deve ser ideal. 

Assim, o trio parte. Depois de longos dias de caminhada, chegam ao referido local. Os ventos fortes e perfumados pelo aroma da mata e do campo, mesclado ao clima agradável, denotava que era aquele o local ideal para dormir. Sem demoras, encontram uma caverna, aparentemente desativada, onde decidem passar a noite. 

Ao entrar na caverna, escutam um rugido. Ao olhar para trás, para a entrada da gruta veem um enorme felino com as garras à mostra e ira nos olhos, correndo em suas direções. Os porquinhos, sem mais o que fazer, correm gruta adentro. Mas o felino era mais rápido. Em instantes o gato se aproximou, e passou direto. Os porcos pararam de correr, mas o felino continuou, apressadamente, gruta adentro. 

- Uai, o que deu nele? - interrogou o caçula - Está de dieta? 

Escutam um som na entrada da gruta. Eles se viram e encontram um rapaz com um tubo metálico nas mãos. 

- Boa noite senhor. - diz o mais velho dos porcos - Posso ajudar? 

No fim do jantar, o homem limpa o beijo num guardanapo. 

- Querida, - pergunta à esposa do outro lado da mesa - os meninos já comeram?

- Sim. Estão terminando o pernil em cima do tapete novo. 

Comentários

Postagens mais visitadas