V(IDA)

Autora: Andressa de Pianti Lopes (Curso Técnico em Eletrotécnica Integrado ao Ensino Médio)

Pálpebras pesadas. Tento abrir os olhos, porém o clarão é mais forte e me cega. Estou mergulhada na mais profunda escuridão. Procuro a lanterna dos afogados. A luz era cinzenta e fria. Então, os borrões começam a ganhar contornos, os contornos ganham formas e as formas ganham vida. Um astronauta. Talvez, por isso o ar... 

Busco de forma incessante o oxigênio. Mas, a tentativa desesperada era em vão. Queria gritar. Queria espernear. Queria misericórdia. No entanto, percebi que era tarde demais. O pânico já estava instaurado. E o pior, em todo o planeta Terra. 

Não. Infelizmente, não eram os aliens nos visitando. O astronauta compadecido balbuciava meia dúzia de palavras em uma tentativa falha de me ajudar a compreender a situação estapafúrdia. Infecções, intubações e mortes: pandemia do Covid-19. O astronauta tentava salvar toda a tripulação, já que essa era a sua missão. Afinal, ele é médico.

A sua imagem turva estava envolta pela doçura e pela exaustão. Física. Emocional. Espiritual. Parecia um mártir. Seria a minha salvação ou a minha dolorosa redenção? Apesar da roupa de proteção, eu conseguia admirar os seus olhos de corça marcados pelas olheiras, enquanto, gentilmente, ele administrava as doses da medicação. Queria poder dizer que as doses eram amargas. Que o cômodo era fétido. Mas, como? Se já não tenho o paladar e o olfato.

Como a lua fui minguando, em um quarto opaco e impessoal de hospital. Os meus fios loiros já não brilham mais como o sol. A incógnita da noite fria está cravada em minha retina. A minha pele pálida parece um tanto perecível. Resta-me respirar a angústia. Estou entre a bigorna e o martelo. Que ironia! Anoitecer como uma reles mortal, logo eu que sempre me considerei uma deusa. Sou embalada pela solidão e pelo silêncio das estrelas.

Sinto-me tão leve. Talvez, seja a ausência da gravidade. Mas, ao mesmo tempo, os corvos bicam meu passado e, principalmente, meu futuro. Se tenho medo? Já não me lembro da v(ida).

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